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Allan Begosso: De brigadeiro nas ruas de Portugal até o octógono do Contender Series

O cândido-motense lutou no Contender Series, evento ‘peneira’ do UFC, promovido por Dana White, chefão do Ultimate e presidente do Ultimate Fighting Championship.

Na terça-feira, dia 13, o lutador cândido-motense Allan Begosso, o ‘Mini’, lutou no Contender Series, evento ‘peneira’ do UFC, promovido por Dana White, chefão do Ultimate e presidente do Ultimate Fighting Championship. Contra o invicto Farid Basharat, Begosso levou perigo no chão, com algumas tentativas de finalização, mas no segundo round, o afegão começou a levar vantagem, com uma boa trocação e ótimo trabalho no solo.
Após uma performance bem equilibrada, Begosso, que é nascido em Cândido Mota, acabou derrotado por decisão unânime após três rounds. Os juízes marcaram 30-27, 30-26 e 30-26 para Basharat, agora 9-0. Begosso caiu para 7-2-1.

História
Mesmo para quem acompanha o lutador cândido-motense, talvez não saiba sua história de lutas para tentar chegar ao UFC. Allan Begosso já foi de torcida organizada, morou em academia, venceu a depressão e até vendeu brigadeiro para sobreviver.
O cândido-motense vive em Sacramento, Califórnia, desde 2019 e está treinando na renomada equipe Alpha Male desde que chegou. O lutador decidiu ir para os EUA ainda em 2017, após sofrer uma lesão numa luta em que recebeu apenas R$ 350 de bolsa, e perceber que teria melhores possibilidades para sua carreira fora do país. Sua noiva, Gabriela, topou a ideia e eles juntaram cerca de US$ 3 mil com a venda de um carro e a rescisão de contrato no emprego dela.
O caminho até Sacramento, porém, teve um desvio na Europa. Uma amiga de Gabriela a incentivou a passar alguns meses em Portugal, onde haveria uma oportunidade no mercado imobiliário (área na qual ela trabalha) e o casal poderia juntar mais dinheiro para a chegada nos EUA. Allan topou, os dois arrecadaram cerca de 800 euros em presentes de casamento e rumaram para Lisboa.
“Foi tudo uma bagunça. Não aconteceu nada do que a amiga dela falou. O dinheiro que a gente tinha, era para pagar quarto para três meses. Foi embora no primeiro mês, porque não era o valor que ela tinha falado. Não tinha nada de venda de imóvel. Minha esposa não conseguiu fazer negócio nenhum. A gente teve que pagar o aluguel do primeiro mês do quarto, a gente tinha que comer e, cara, acabou o dinheiro”, conta Begosso.
Quebrados, mas dispostos a guardar os dólares para a mudança para os Estados Unidos, o casal apostou numa solução barata para se levantar: vender doces caseiros. Gabriela já tinha feito curso de gastronomia e deu a ideia de fazer ‘brigadeiros gourmet’ para vender nas ruas. Allan gastou os 30 euros que sobraram na conta nos ingredientes e numa vasilha para levar os doces. A dupla produziu 50 unidades e foi à luta.
“Saímos parando pessoa a pessoa, e vendemos rápido! Pegamos esse dinheiro, fomos no mercado e compramos mais, reinvestimos. Fomos vendendo, vendendo… A galera começou a conhecer a gente, ‘É o casal dos doces lá, o casal dos brigadeiros!’. E chamava a gente, parava a gente, tirava foto, porque minha esposa falava, ‘A gente precisa voltar para o Brasil, para ir aos Estados Unidos, porque ele tem um sonho de ser lutador. Você não quer comprar um brigadeiro para ajudar?’. Às vezes eu entrava no meu Facebook e alguém tinha me marcado com o brigadeiro! Foi uma coisa bem doida, muito estressante, mas ao mesmo tempo a parte dos brigadeiros foi uma lembrança gostosa”, lembra.
O casal arrecadou cerca de 3 mil euros com os doces, que serviram para bancar as passagens de volta ao Brasil e de ida aos EUA. Ao chegar na Califórnia em fevereiro de 2019, ‘novo perrengue’: os dólares também só duraram um mês. Além disso, após passar um ano parado com a lesão na mão, que exigiu três cirurgias, Begosso demorou a ‘engrenar’ na Alpha Male e só voltaria a lutar no segundo semestre de 2020.

O inimigo interno
Ao todo, foram dois anos e meio sem lutar profissionalmente. Parte disso foi a briga para conseguir o visto de atleta, que custava US$ 7 mil e exigiu ‘bicos’ e mais venda de doces para reunir a verba. A outra parte foi que, no meio desse processo, Begosso encontrou um adversário impiedoso: a depressão.
“Quando eu ia conseguir dar uma respirada, entrei em depressão. Comecei a ter ataques de pânico, eu não conseguia treinar. Eu chegava na porta da academia, começava a chorar, não conseguia entrar e foi uma fase muito difícil para mim. Isso durou um tempão, até hoje eu faço tratamento”, contou o cândido-motense.
O lutador contou com o apoio da esposa e de uma psicóloga para vencer o inimigo silencioso. Ele ressalta a importância de se vencer o estigma e confiar na psicologia, que, segundo ele, foi crucial para que voltasse a lutar.
“Foi uma das coisas que me tirou disso e me pôs de volta no jogo. Depois disso, eu consegui uma luta em 2020, consegui um ótimo nocaute, foi minha primeira luta nos Estados Unidos e aquela vitória me abriu as portas para muita coisa. Foi muita persistência, muito trabalho, minha esposa e minha família me ajudaram muito”, ressaltou.

‘O que eu estou fazendo aqui?’
No início de julho, Allan Begosso roubou a cena no LFA 135 com um belo nocaute na ‘joelhada voadora’ em Paris Stanford, com apenas 45 segundos de luta. A vitória lhe valeu a oportunidade no Contender Series e, ao saber que faria a luta principal, o paulista disse ter visto um filme de sua vida passar em sua mente. Lembrou da infância conturbada e como isso o levou às artes marciais.
Com muito rancor e energia, o pequeno Begosso, ainda aos 10 anos de idade, começou a praticar golpes com amigos na quadra do prédio onde morava. Outro jovem que ‘brincava’ ali, Rafael Ventura, treinava na academia de Anderson ‘Braddock’ Silva, craque do kickboxing, e o chamou para se juntar a ele. Ventura arrumou bolsa para que Allan pudesse treinar – escondido da mãe, que não aprovava a ideia. Alguns anos depois, brigado com a mãe, ele se mudaria para a academia, onde viveria por um ano.
Mais ou menos na mesma época, Begosso integrava a Gaviões da Fiel, torcida organizada mais famosa do Corinthians. O lutador tem boas lembranças do período, mas reconhece que estava num estilo ‘vida louca’ e que foi preciso deixar as arquibancadas para colocar o trem nos trilhos.
“O ponto crucial para mim foi quando eu fui para um jogo, estava no ônibus, e a gente passou em frente a uma delegacia. Era Corinthians e Santos, lembro até hoje. A gente passou em frente a uma delegacia, ali os caras começaram a tacar bomba, cheio de droga no ônibus. Eu falei: ‘P***, que que eu estou fazendo aqui?’ A minha sorte é que eu era menor, os caras me liberaram. Um monte de gente ficou presa na delegacia. E eu saí. Depois desse dia, falei: ‘Não, isso aqui não é pra mim’”, lembra. Allan Begosso se considera abençoado simplesmente pela oportunidade de participar do Contender Series. “Mesmo que seja clichê, se você acreditar e trabalhar duro, não importa quanta dificuldade você passar, vai acabar chegando. Para mim, isso já é uma p*** vitória. Sobre a luta, não há muito a dizer, tentei fazer o meu melhor! Obrigado sempre aos verdadeiros, voltarei como de costume. Obrigado @ufc @danawhite @seanshelby @mickmaynard2 e toda equipe do ufc! Tudo foi uma experiência incrível. Eu sei porque todo mundo quer estar lá, o tratamento com os atletas é incrível. Até breve novamente”, escreveu Begosso, em suas redes sociais.

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